sexta-feira, 29 de setembro de 2017

RISO




RISO

Preciso tanto de risos!
Quero roubá-los das bocas
Do silêncio das almas sãs
Quero tocar nos pensamentos
Translúcidos voam com o vento
Quero sentir as melodias
Feitas de encantamento e riso
Quero as estrelas dos olhares
Que brilham e riem em comunhão
Quero até os restos de ternura
Porque a ternura tem riso
E o riso afasta-me da solidão.
           

            Anabela Coelho


quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Sátira aos HOMENS - António Lobo Antunes



















....Pachos na testa, terço na mão,
Uma botija, chá de limão,
Zaragatoas, vinho com mel,
Três aspirinas, creme na pele
Grito de medo, chamo a mulher.
Ai Lurdes que vou morrer.
Mede-me a febre, olha-me a goela,
Cala os miúdos, fecha a janela,
Não quero canja, nem a salada,
Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.
Se tu sonhasses como me sinto,
Já vejo a morte nunca te minto,
Já vejo o inferno, chamas, diabos,
Anjos estranhos, cornos e rabos,
Vejo demónios nas suas danças
Tigres sem listras, bodes sem tranças
Choros de coruja, risos de grilo
Ai Lurdes, Lurdes fica comigo
Não é o pingo de uma torneira,
Põe-me a Santinha à cabeceira,
Compõe-me a colcha,
Fala ao prior,
Pousa o Jesus no cobertor.
Chama o Doutor, passa a chamada,
Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.
Faz-me tisana e pão de ló,
Não te levantes que fico só,
Aqui sozinho a apodrecer,
Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer
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António Lobo Antunes - Sátira aos HOMENS quando estão com gripe

terça-feira, 26 de setembro de 2017

Sabe o que a poesia faz ao seu Cérebro? Um imenso bem...






Sabe o que a poesia faz ao seu Cérebro?

Por Jennifer Delgado Suárez

Poesia são dardos em forma de palavras que vão directo para a parte mais emocional do nosso cérebro. Há poemas que despertam um tsunami emotivo real e nos arrepiam, como “A Primeira Elegia”, de Rainer Maria Rilke, cujos versos dizem:

“A beleza é nada mais que o princípio do terrível,
Aquilo que somos apenas capazes de suportar,
Aquilo que admiramos porque serenamente deseja nos destruir,
Todo anjo é terrível. ”

Rilke descreveu o terror que sentimos quando adquirimos um conhecimento mais amplo, o momento em que ficamos mais conscientes de nossas limitações e da complexidade do mundo, e percebemos tudo o que não entendemos, conscientes daquilo que nunca iremos compreender. É uma possibilidade bela e sedutora, mas também muito assustadora.
A poesia tem a capacidade de enviar poderosas mensagens emocionais e activar a reflexão, ainda que seja certo dizer que o maior prazer que sentimos ao ler um poema, como quando desfrutamos de uma obra de arte, não provém de uma reflexão profunda, mas de sensações que nós experimentamos. Na verdade, Vladimir Nabokov disse que não se deve ler com o coração ou com o cérebro, mas com o corpo.
Pesquisadores do Instituto Max Planck de Estética Empírica se propuseram a explorar mais a fundo as influências da poesia em nosso cérebro, e os resultados de seu estudo são fascinantes.
A poesia gera mais prazer, a nível cerebral, que a música.
Pesquisadores pediram a um grupo de pessoas, alguns liam poesia com frequência, para ouvir poemas lidos em voz alta. Alguns dos poemas pertenciam a conhecidos poetas alemães como Friedrich Schiller, Theodor Fontane e Otto Ernst, apesar de que foi dada a opção para os participantes escolherem algumas obras, incluindo autores como William Shakespeare, Johann Wolfgang von Goethe, Friedrich Nietzsche, Edgar Allan Poe, Paul Celan e Rilke.
Enquanto os voluntários escutavam os poemas, os pesquisadores registravam o ritmo cardíaco, expressões faciais e até mesmo os movimentos dos pelos sobre a pele. Além disso, quando as pessoas sentiam um arrepio, elas eram instruídas a avisar, pressionando um botão.
Curiosamente, todas as pessoas, mesmo aquelas que não tinham costume de ler poesia, relatavam calafrios em algum momento durante e leitura, 40% sentiram arrepios várias vezes. Estas são respostas similares àquelas que experimentamos quando escutamos música ou assistimos a uma cena de um filme que gera grande ressonância emocional.
No entanto, as respostas neurológicas estimuladas pela poesia eram únicas. Os dados mostraram que ao tomar contacto com os poemas, partes do cérebro usualmente desactivadas quando expostas ao estímulo de filmes e música foram despertadas.
Os neurocientistas descobriram que a poesia cria um estado que chamaram de “pré-relaxamento”; ou seja, que provoca uma reacção de prazer gradativo a cada estrofe escutada. Na prática, ao invés da emoção nos invadir repentinamente, como quando escutamos uma canção, a poesia gera um crescendo emocional que começa até 4,5 segundos antes de sentirmos o arrepio.
Curiosamente, esses picos emocionais ocorriam especificamente em trechos dos versos, como no final das estrofes e, acima de tudo, no final da poesia. É uma descoberta muito interessante, especialmente considerando-se que 77% dos participantes que nunca tinha escutado um poema também mostraram as mesmas reacções e sinais neurológicos que antecipavam os focos emocionais da leitura.
A poesia estimula a memória, facilita a introspecção e nos relaxa.
Neurocientistas da Universidade de Exeter escanearam os cérebros de um grupo de participantes enquanto liam conteúdos diferentes, desde um manual de instalação de ar-condicionado, passando por diálogos de novela, até sonetos e poemas.
Estes pesquisadores descobriram que o nosso cérebro processa a poesia de forma diferente que a prosa. É activada uma “rede de leitura” peculiar que abraça diferentes áreas, entre elas, aquelas responsáveis pelo processamento emocional, activadas fundamentalmente pela música.
Eles também perceberam que a poesia estimula áreas do cérebro associadas com a memória, como o córtex cingulado posterior e o lobo temporal médio, áreas que são despertadas quando estamos relaxados, ou introspectivos.
Isto demonstra que existe algo muito especial na estrutura do texto poético que gera prazer. Na verdade, a poesia é uma expressão literária muito especial que transmite sentimentos, pensamentos e ideias, praticando síntese métrica, trabalhando rimas e aliteração.
Portanto, é óptimo para o nosso cérebro inserir um poema por dia em nossa rotina.




Ria de Aveiro













Ria de Aveiro

Toda a ria canta nas asas divinas de um pássaro
Que leva no bico o coração de um povo
Entrançado de moliço e apelo de maresia

Em tuas límpidas águas meus olhos se banham
Quando o Sol se esconde por entre os canais
E a brisa serena, nos conduz de novo ao cais



Virgínia Bastardo


segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Mercedes Sosa - Honrar la vida



Não! Permanecer e deixar andar
Não, perdurar não é existir
Nem honrar a vida

Há tantas maneiras de não ser
Tanta consciência sem saber
Adormecida

Merecer a vida não é calar e permitir
Tantas injustiças repetidas
É uma virtude, é dignidade
E é a atitude de identidade
Mais definida

Isso de durar e deixar andar
Não nos dá o direito de presumir
Porque não é o mesmo que viver
Honrar a vida

Não! Permanecer e deixar andar
Nem sempre quer dizer
Honrar a vida!

Há tanta pequena vaidade
Na nossa tonta humanidade
Que está cega

Merecer a vida é erguer-se na vertical
Mais além do mal e das quedas
É igual que dar à verdade
E à nossa própria liberdade
As boas-vindas

Isso de durar e deixar andar
Não nos dá o direito de presumir
Porque não é o mesmo que viver

Honrar a vida

sábado, 23 de setembro de 2017

Outono Anunciado



No arrepio de um Outono anunciado
O Sol, é fogo que atrai o olhar
As ondas, lânguidas no espreguiçar
A nossa conversa querem escutar

E o céu desdobra-se sobre o mar
Em tela impossível de imitar
Quanta Paz, quanto Amor
Aos nossos pés vêm depositar

E neste louvor partilhado
De bem-querer sublimado
Quanto de ti ou de mim
Possa ser mensurado


Maria de Jesus






sexta-feira, 22 de setembro de 2017

Madrugada minha




É na madrugada que a luz é mais pura

Na ténue escuridão que luta por vencer

Não engalanada pelo que acredita ser

Contém em si a força do sol por nascer


A.


segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Serenata à Lua





Serenata à Lua

No lusco-fusco do anoitecer, quanta esperança
Nos tantos olhares que se elevam à Lua
Absortos no esplendor da tua magia
Senhora das marés, rainha da noite

Quarto Crescente, florescente pró criador
Lua Nova resplandecente, fecunda
Quarto Minguante de brilho plangente
Lua Cheia, de seio farto, nutridora

Musa dos poetas que te deram um coração
Timbre do canto de quem sente a emoção
De te saber areal sereno ou banco de jardim
Onde os olhares ausentes se encontram
...E se dão as mãos


Maria Adelina







domingo, 17 de setembro de 2017

OS SONHOS SÃO PÉTALAS DA VIDA



O sonho repica à minha beira
Vagueia na mente em frenesim
Corre lentamente na minha ribeira
Sempre à procura de mim.

Passa em cada viagem
Mensagem nem sempre presente
Na diversidade da imagem
Tacteia, ora triste ora contente.

Mas quando acordo, morre
Tantas vezes sem fim
No sono, o sonho vadio corre
Sem querer olhar para mim.

Venero os sonhos da minha mente
Das entranhas puras da razão
A percorrerem a minha corrente
Nas águas límpidas da inspiração.

Vidas sem sonhos são adormecidas
Mendigas de vontade e emoção
São como folhas caídas
Que deambulam no chão.

Álvaro Lima




sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Nas folhas do meu caderno



Vivem saudades e mar
Vivem os dias de inverno
Que me acalentam o olhar.
A folhear o meu rosto
Também se pode sonhar
E tu vieste da noite
Trouxeste contigo os braços
Com que me queres abraçar.

A madrugada que temos
Vestiu de bruma a cidade
Mas deixou nela esta brecha
Que me traz uma saudade
Que não posso mais calar.

É uma dor tão macia
Ao teu jeito, meu e teu
Vive em nós num desatino
Que procuramos os dois.
Será mar, rio ou regato
Que importa, se só eu sei
Saborear esta rota?
Onde nos leva, não sei.

Com esta saudade ao colo
Não há invernos nem ventos
Embalamos o que somos
Na madrugada de bruma
Aveludada de beijos
Na explosão dos sentidos
Na urgência dos desejos.

Nas folhas do meu caderno
Vivem saudades e mar
Cabem madrugadas loucas
Abraços, juras no ar
Desejos sem freio, loucos
Que nos fazem aninhar.

E na alcova tão macia
Tão morta por nos tapar
Ambos sorrimos à vida
Damos largas ao desejo
Soltamos toda a ternura
Amaciamos a vida
Damos-lhe um sabor a mar.

Maria Aida Araújo Duarte.





terça-feira, 12 de setembro de 2017

A Deus



A Deus

Alvos lenços que se agitam com fervor
Mas! Se sois os celeiros do Meu Ser
Eu Sou o cais onde vos cruzais
As naus da Minha expansão

Cancioneiros do Cosmos
Minha essência, Minha voz
Na unidade do que Sou
Em Mim, sois vós também

Minha estrela peregrina aonde queres migrar
Se Minha Voz Minha Luz te estão a amparar
E tu, ave de fogo, semente de trigo a florir
Em ti Me faço obra para o Cosmos evoluir

De vossos lábios em prece, é um louvor a soar
Corações sentidos, um “A Deus” a murmurar
Inspirem o meu alento, no fremir do vento
Acordem meus Anjos...

Que outro dia nasce
E os campos se abrem à sementeira
Despertem da ilusão da separação
Só o Todo em vós, a Mim recria


Do Livro: Hieróglifos do Cosmos



segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Escuta o Vento


Escuta o vento

No prado azul dos dias
É a melodia que ressoa nos ciclos da terra
Que retém na memória a forma, a cor, da
Imagem com que meu coração te investiu
Água, adubo da vida no eterno renascer

Escuta o vento

Nele gravei com esmero e doçura
Asas de anjos em cada flor
Coroas de  teu amanhecer
Chama Crística
Que na escuridão de teus sentidos
Enche de bênçãos,  teu caminhar

Deixa-te abraçar,
Pelo vento, bálsamo de toda dor

Maria de Jesus

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Menino Perdido




Os teus segredos

São as mais preciosas pérolas na arca de tesouros que me deste
Criança de luz a quem a sombra esmorece a vontade
Dos teus medos, fiz beijos perfumados que os desarmam
Das raivas, abraços silenciosos que lhes tiram a memória
E os outros, os que deixamos sem nome, 
nomeio-os as Cinco Chagas de Cristo 
que te lembram a todo instante
 o renascer do homem novo
 no qual sei, edificarás.


Nina



segunda-feira, 4 de setembro de 2017

Que olham os poetas?

De que serve






De que serve a bondade 
Quando os bondosos são logo abatidos, ou são abatidos 
Aqueles para quem foram bondosos?

De que serve a liberdade 
Quando os livres têm que viver entre os não-livres?

De que serve a razão 
Quando só a sem-razão arranja a comida de que cada um precisa?

Em vez de serdes só bondosos, esforçai-vos 
Por criar uma situação que torne possível a bondade, e melhor; 
A faça supérflua!

Em vez de serdes só livres, esforçai-vos 
Por criar uma situação que a todos liberte 
E também o amor da liberdade 
Faça supérfluo!

Em vez de serdes só razoáveis, esforçai-vos 
Por criar uma situação que faça da sem-razão dos indivíduos 
Um mau negócio!


Bertolt Brecht


Quando chove lá fora, e cá dentro...


Caminhante não há caminho, faz-se caminho ao andar






Todo pasa y todo queda,
pero lo nuestro es pasar,
pasar haciendo caminos,
caminos sobre el mar.

Nunca persequí la gloria,
ni dejar en la memoria
de los hombres mi canción;
yo amo los mundos sutiles,
ingrávidos y gentiles,
como pompas de jabón.

Me gusta verlos pintarse
de sol y grana, volar
bajo el cielo azul, temblar
súbitamente y quebrarse…

Nunca perseguí la gloria.

Caminante, son tus huellas
el camino y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar.

Al andar se hace camino
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.

Caminante no hay camino
sino estelas en la mar…

Hace algún tiempo en ese lugar
donde hoy los bosques se visten de espinos
se oyó la voz de un poeta gritar
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso…

Murió el poeta lejos del hogar.
Le cubre el polvo de un país vecino.
Al alejarse le vieron llorar.
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso…

Cuando el jilguero no puede cantar.
Cuando el poeta es un peregrino,
cuando de nada nos sirve rezar.
“Caminante no hay camino,
se hace camino al andar…”

Golpe a golpe, verso a verso.

António Machado

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

NORTADA











Quando a nortada varre a praia
O vento desabotoa-me a pele
Com mãos de cabritinhos…
Agarra-me pelos cabelos
E leva-me longe
Tão longe…
Onde só os pássaros podem ir.


Teresa Queirós Ferreira