terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Diz o meu nome




Diz o meu nome
pronuncia-o
como se as sílabas te queimassem
os lábios
sopra-o com a suavidade
de uma confidência
para que o escuro apeteça
para que se desatem os teus cabelos
para que aconteça

Porque eu cresço para ti
sou eu dentro de ti
que bebe a última gota
e te conduzo a um lugar
sem tempo nem contorno

Porque apenas para os teus olhos
sou gesto e cor
e dentro de ti
me recolho ferido
exausto dos combates
em que a mim próprio me venci

Porque a minha mão infatigável
procura o interior e o avesso
da aparência
porque o tempo em que vivo
morre de ser ontem
e é urgente inventar
outra maneira de navegar
outro rumo outro pulsar
para dar esperança aos portos
que aguardam pensativos

No húmido centro da noite
diz o meu nome
como se eu te fosse estranho
como se fosse intruso
para que eu mesmo me desconheça
e me sobressalte
quando suavemente
pronunciares o meu nome


Mia Couto

sábado, 28 de janeiro de 2017

O Recomeço de "MANHÃS DE POESIA" -


Tarde Longa





Tarde Longa

Se eu for à casa do amor
Hei-de encontrar-te sentado
À espera que eu me dispa
Conforme foi combinado

E se a tarde for inteira
Nessa pátria a que pertenço
Ficaremos abraçados
Estendidos como num lenço

Ah, quem me dera que os céus
Fossem mais largos, mais fundos,
Despidos somos de deus,
Vestidos somos do mundo

Mas de nós mesmos seremos
Se a tarde for tão comprida
Que o mesmo lenço se estenda
Ao longo de toda a vida


Lídia Jorge


Dizem



Dizem

Dizem que a paixão o conheceu
mas hoje vive escondido nuns óculos escuros
senta-se no estremecer da noite enumera
o que lhe sobejou do adolescente rosto
turvo pela ligeira náusea da velhice

conhece a solidão de quem permanece acordado
quase sempre estendido ao lado do sono
pressente o suave esvoaçar da idade
ergue-se para o espelho
que lhe devolve um sorriso tamanho do medo

dizem que vive na transparência do sonho
à beira-mar envelheceu vagarosamente
sem que nenhuma ternura nenhuma alegria
nenhum ofício cantante
o tenha convencido a permanecer entre os vivos


Al Berto


quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

O teu riso


O teu riso


Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Pablo Neruda



quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Um simpático desafio, vamos lá participar?



Poetas Vivó`s Poetas vem mais uma vez trazer um simpático desafio a todos aqueles que têm a poesia no coração e que queiram partilhar a sua inspiração. O modo de participação é muito simples

Temos todo o prazer de receber Poemas de vossa autoria sobre o tema
“Recomeços”

Os poemas devem ser enviados até 30 de Janeiro. Os poemas recebidos serão avaliados por um júri que irá escolher aquele que mais se destaque. Este será agraciado com uma lembrança e apresentado no próximo  “Manhãs de Poesia” que vai acontecer no dia 12 de Fevereiro.

Todos os poemas enviados serão postados no nosso blogue com a devida autorização dos respectivos autores.

Caríssimos Amigos, muita e boa inspiração para os “Recomeços”  neste início de um novo ano.

Enviem pf os vossos poemas para:



terça-feira, 17 de janeiro de 2017

O Prazer de Servir




O Prazer de Servir


Toda a Natureza é um desejo de serviço.
Serve a nuvem, serve o vento, servem os vales.
Onde haja uma árvore que plantar, planta-a tu;
Onde haja um erro que emendar, emenda-o tu;
Onde haja um esforço que todos evitam, aceita-o tu.

Sê aquele que afasta a pedra do caminho,
O ódio dos corações e as dificuldades de um problema
Existe a alegria de ser são, e a alegria de ser justo,
Mas existe sobretudo, a formosa a imensa alegria de servir.
Como seria triste o mundo se tudo já estivesse feito,
Se não houvesse um roseiral que plantar, uma empresa que iniciar!
Que não te atraiam somente os trabalhos fáceis.

É tão belo fazer a tarefa a que outros se esquivam!
Mas não caias no erro de que só se conquistam méritos
Com os grandes trabalhos;
Há pequenos serviços que são imensos serviços:
Adornar a mesa, arrumar os bancos, espanar o pó.
Aquele é o que critica, este é o que destrói;
Sê tu o que serve.

O serviço não é tarefa só de seres inferiores.
Deus, que dá o fruto e a luz, serve.
Poder-se-ia chamá-lo assim: Aquele que serve.
E Ele, que tem os olhos em nossas mãos, nos pergunta todo dia:
“Serviste hoje? A quem? À árvore, a teu amigo, à tua mãe?”

Gabriela Mistral (Prémio Nobel Literatura 1945)


segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Caverna














CAVERNA

Foi a noite mais noite de todas as noites
A faca mais funda que abriu o meu peito
E até a luz também era noite
Era tudo noite, num ciclo perfeito!

No fundo do poço, o sangue gelava,
O meu ser era roupa amarrotada,
Era o chão frio, chão impossível,
Não havia dia, não havia luz, não havia nada!

Parecia que voava no escuro
Contra invisíveis paredes
Não tinha saída. A alma vazia
Era uma sede maior que todas as sedes!

Depois, um halo de luz, ou uma sombra, pairou por momentos
No fundo da caverna, mas era tudo ilusão,
Estava mesmo prisioneiro
Na mítica caverna de Platão! 


A. Alves Cardoso




sábado, 14 de janeiro de 2017

Amor que inunda a alma




Amor que inunda a alma

O amor que inunda minha alma é transparente
Não tem desenhados os traços de um rosto
Mas tem vincada a doce pressão do enlace
Dos braços extensos, fortes, da eternidade

Cada palavra minha tem o som de um poema 
Que flui em cascata, água sagrada
Ressalta em búzios burilados, diamantes
Em cujo brilho está gravado o enigma da vida

Cada ano me aproxima da estação engalanada
Do reencontro com a voz do meu amparo
Beijo que ressuscita, água no deserto
Fogo da minha alma

Que o tempo temperou com sol e lua, e
Estrelas alfabetos que lhe compõem o nome
A memória desenhará seu rosto na estação
Onde os comboios em breve se encontrarão


Maria de Jesus





A Todos Vós





Caríssimos Amigos, Colaboradores e Seguidores deste "sítio" onde flui a poesia 

Expressamos os nossos melhores votos para este novo ano, que seja profícuo de tudo o que seja construtivo para o bem supremo de cada um e generoso em inspiração pela poesia ou qualquer outra arte que enalteça a alma e nos torne mais humanos, fraternos, pacificados.

Além deste local onde podem beber e contribuir com o elixir da poesia, retomaremos em breve outras actividades das quais daremos notícias em breve.

Lembramos que podem publicar os vossos poemas neste blogue, basta enviar para:

poetasvivospoetas@gmail.com


Até sempre e muita poesia na vida de todos nós...